terça-feira, 19 de agosto de 2008

O SONHO ACABOU


Como todo mundo ja deve estar sabendo acabou o Depósito de Teatro. Justamente no ano em que completaria dez anos de atuação e luta renhida pela sua permanência, encerrou suas atividades e fechou as portas da sua sede na Rua Câncio Gomes. Era impossível continuar. Eu mesmo ja me perguntei mais de mil vezes como isso pôde acontecer, como eu estou me sentindo a respeito e qual a extensão exata dos danos causados na minha pessoa e na minha sensibilidade. Foram 10 anos de árduo trabalho e dedicação intensa a uma causa que se mostrou no mínimo irrelevante. Nenhum veículo de comunicação se interessou pelo fato. Nem o Caco, blog do Renato Mendonça, que colocou duas linhas sobre o assunto alimentando a rede de boatos, foi capaz de nos perguntar o que aconteceu e quais os reflexos disso na cultura local. O Sated nem tomou conhecimento. Na classe passou em branco. Cada um voltado para suas criações, seus umbigos e egos e problemas. Não recebemos nenhuma adesão ou pedido de explicação. Nada se passou. Um grupo como o Depósito de Teatro se extingue e nada acontece. Acho isto, no mínimo, sintomático.
Sinto-me mais amassado do que nunca. Combalido, sem forças, perplexo, desanimado. Sobrevem uma sensação de ter desperdiçado dez anos da minha vida num projeto insano e absolutamente desnecessário. Parece que se fizéssemos uma greve do teatro em Porto Alegre, ninguém daria a menor importância. A quem interessa? Sejamos francos: a ninguém.
Várias pessoas poderiam ter usado sua influência, relação de amizade e proximidade com o poder para fazer vingar o projeto de instalar um centro multi-cultural no meio de um bairro decadente e abandonado. Luciano Alabarse, o todo-poderoso diretor do Porto Alegre em Cena; Sergius Gonzaga, titular da pasta municipal da Cultura que se interessa apenas pelo setor do livro; Caco Coelho, diretor da Usina do Gasometro, Cláudia d'Mutti, diretora do setor de artes cênicas da Funarte, a coordenadora regional do MinC, o homem de teatro, dono de casa de espetáculo e presidente da FUNARTE, Celso Frateschi. Não fizeram. Prefiriram ficar de costas e tratar a questão como um problema particular e meramente empresarial.
Várias empresas do entorno deveriam ter investido na permanência do grupo. Não fizeram. Prefiriram ficar de costas para o mais importante projeto cultural jamais pensado e proposto para aquela região. A burrice dos empresários gaúchos é do tamanho de um rinoceronte. Devido a uma generalizada pobreza cultural não enxergam um palmo na frente do seu cotidiano capitalista. Tentamos de todas as formas nos equilibrar e nos manter firmes na nova sede. O projeto não se demonstrou viável. Infelizmente, levei dez anos para perceber isso.
Pensamos em fazer um grande enterro do Depósito, mas ficamos com medo de represálias a futuros projetos que levem o nome de algum ex-integrante do Grupo. Estou me sentindo paralisado, emparedado.
Ter sido enganado pelo próprio prefeito José Fogaça, que fez todo um jogo de cena numa reunião que nos fez esperar mais de um ano e meio pela aprovação de um projeto que até hoje continua tramitando e que ficará eternamente tramitando. Pena que a cultura seja tão pobre e tratada de uma forma tão mesquinha, que estes fatos nem vão arranhar a sua re-candidatura ao posto de prefeito.
Ter sido penalizado arbitrariamente pela FUNARTE e não conseguir em momento nenhum uma audiência com o seu presidente, Celso Frateschi, que veio inúmeras vezes a Porto Alegre e não foi capaz de nos convidar para uma conversa, onde tudo pudesse ser esclarecido. A FUNARTE desconheceu as provas que apresentamos e ainda nos tachou de aproveitadores e desonestos. Imaginem. Uma entidade que invariavelmente atrasa seus pagamentos ou simplesmente cancela seus compromissos assumidos. A FUNARTE foi tremendamente injusta. Opção: entrar com um processo na Justiça contra um órgão do Governo Federal, esperar entre dois e cinco anos para ter uma sentença e ter a vida trancada pelos burocratas durante todo este tempo. Maravilhosa opção.
Todas estas atitudes provocam um sentimento de desimportância, um enorme desânimo geral e uma forte descrença no meio, nos administradores culturais, nos políticos, e na validade de propostas sociais.
Vamos então deixar de hipocrisia. Que descentralização, o quê? Que inclusão cultural coisa nenhuma. Os funcionários querem apenas se locupletar. Querem salvar sua pele. Se beneficiar do poder e salário que recebem. Fechem a Secretaria de Cultura do Estado. Ela não funciona desde que o Appel saiu há mais de vinte anos. Estão sucateando a cultura local. A atuação dos últimos três governos na área cultural é daninha, é criminosa. Logo teremos somente CTGs e o dia 20 de setembro no calendário cultural do estado. Ou nem isso. Chega de cabide de emprego. Ou trabalham ou caiam fora. Chega de ouvir os artistas, de escutar a classe. Baboseira. Estão se lixando para o que a classe pensa. Quando uma SMC vai apresentar um projeto cultural para Porto Alegre comtemplando todas as demandas de uma cidade que não é mais uma província. A quem interessa manter Porto Alegre como uma província? Chega de discursos vazios, reuniões simpáticas, política de balcão e favorecimentos da amizade. Chega de reinados. De feudos. A quem vocês todos ocupantes de cargos pensam que estão enganando?
Perdi 10 anos de trabalho investido, perdi minha casa, minha cara, perdi minhas referências, perdi o tesão, perdi meu rumo, não sei bem o que vou fazer daqui pra frente. Pode ser que seja apenas uma fase passageira, e que logo a seguir eu ache este texto um tanto dramático,mas isso não impede que eu me sinte exatamente assim neste momento.
Primeiro pensei que Porto Alegre perderia também com a extinção do grupo do espaço e do projeto, mas percebo que Porto Alegre não perderá nada, simplesmente porque nem se dá conta das coisas que perde.
Este texto pode parecer um tanto magoado, cheio de auto-comiseração e acusações extremadas. Mas quem me conhece sabe que só parece. Fico num impasse: ou me calo e dou corda a hipocrisia, ou penduro as chuteiras e vou morar na Casa dos Artistas, ou radicalizo minhas opiniões e preservo minha sensibilidade e dignidade de artista intacta denunciando claramente as coisas que me incomodam. Ultimamente, estou mais voltado a exercitar esta última opção. Apertar o botão do foda-se.

Roberto Oliveira
Foto: Kiran

DESÂNIMO TOTAL

Não aguento mais estar aqui em BH. Estou louco pra voltar pra minha casa que não é minha e pra minha cidade que é o lugar onde eu nasci. Não sei exatamente porque quero tão ansiosamente voltar. Na verdade, voltar me apavora porque não sei o que fazer. A destruição de dez anos de trabalho duro no Depósito de Teatro me achatou. Estou tentando manter o bom humor e o astral elevado para não cair em depressão, fingindo que estas coisas acontecem, que empresas vão a falência, que vidas tem que ser reconstruídas, mas a verdade é que é dolorido demais e completamente desanimador. O que faço agora? Teatro? Pra quê? Com quem?

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

PRIMEIRA ANOTAÇÃO



Há quase dois meses estou em Belo Horizonte. Como todo estrangeiro, turista ou trabalhador temporário, como é o meu caso, tenho caminhado bastante. Assim sendo, acho que já posso me dar ao direito de emitir alguma impressões sobre a cidade.
Então vamos lá:
Trata-se de uma cidade tão desumana quanto qualquer cidade que se pretenda grande. Favelas gigantescas. Concreto esmagador. Trânsito terrível e cruel para com os pedestres. Quem tem carro é que manda. Os morotistas são péssimos e embuídos de um prepotente espírito assassino. Fecham cruzamentos. Se fecham uns aos outros. Não respeitam as faixas preferenciais para pedestres e se ocê bobear eles te atropelam "com toda razão".
A porcentagem de mulheres feias é elevadíssima e em geral elas se vestem muito mal. Mesmo aquelas que apostam nas grifes dos vários mega shoppings da cidade se vestem com um mau gosto impressionante. A cidade tem uma vida cultural agitada, cheia de bares e magníficos restaurantes, com uma programação artística variada com a predominância do brega, o teatro infantil é da pior qualidade e o teatro adulto também se encontra infestado de produções caça-níqueis, comédias rasas e shows baianizados. A mineirice é visível. O pé na roça do cidadão comum e até de uns mais intelectualizados. Somente as ladeiras de Ouro Preto são mais íngremes que as daqui. É um inferno sair pra dar uma caminhada. Via de regra eu desisto. O transporte urbano é péssimo e ultra demorado. Tirando todas estas coisas que não prestam o resto é muito bom.
Roberto O.