domingo, 5 de julho de 2009

MINHA NETA VALENTINA

Fui ver minha neta Valentina. A fragilidade exposta ao extremo. Maravilhosa em sua pequenez. Em sua essência de vidro. Valentina é a própria vida lutanda para ser vida. Impossível não se emocionar ao tocá-la. Valentina é o futuro. Incerto. Nasceu dia 21 de junho com apenas 28 semanas. Sejas muito bem-vinda frágil Valentina.

RECORDAÇÕES DO DECAMERON - CAPÍTULO 2

Neste capítulo as viagens, os prêmios em Porto Alegre, as mudanças no elenco, etc

sábado, 4 de julho de 2009

AINDA ORANGOTANGOS



eu simplesmente adorei fazer o filme. por vários bons motivos, eu adorei fazer o filme. o gustavo spolidoro tem uma alegria esfuziante de trabalhar e de viver, tem um entusiasmo pelo que faz que é contagiante. uma maravilha de trabalhar com uma pessoa assim. ele me convidou pra fazer o "quarentão" quando a gente estava terminando de rodar o "cão sem dono". voltando numa van disse que queria que eu fizesse o personagem. que quando eu o texto pensou logo em mim para o papel. fiquei completamente feliz e comprei o livro e li uma vez o livro e dez vezes o meu conto, o conto que havia inspirado a cena. era fascinante. além disso, eu estava sendo apresentado ao excelente escritor paulo scott (o mesmo de "crucial2.1"). e mais além disso, fui convidado para fazer o teste com as atrizes pré-selecionadas para opapel de "garota tatuada". improvisei a cena com duas gurias muito tatuadas. a primeira foi a letícia. letícia bertagna. falante. tentando ser solta e parecer relaxada. sorridente. tão feliz quanto eu de ter nas mãos a oportunidade de fazer aquele filme. com gana de ganhar. de cara gostei da cara dela. bateu. a outra menina, se chamava samy, linda, com umas tatuagens mais "carregadas" do que as da letícia. coisa louca: as duas tinham filho, meninos, e as duas tinham uma imagem do filho tatuada no corpo. samy era mais quieta, mais preocupada, tensa. fizemos duas vezes a cena. foi legal. o gustavo ficou pensativo. a escolhida foi a letícia e nós dois ficamos muito felizes de fazer o filme juntos. conversávamos muito, estávamos sempre juntos, bebendo cerveja e mais cerveja e muito perfume. foi uma maravilha. foi uma sorte minha. sorte grande também foi saber que eu estava no primeiro filme em um único plano-sequência.

ADEUS, MAMÃE


morreu minha mamãe. na verdade, nunca chamei ela de mamãe a não ser nos últimos anos. depois dos setenta que foi quando minha mãe virou velhinha. pelo menos foi quando eu a olhei e achei que ela estava ficando com cara e jeito de "vovó". antes, eu a chamava muito mais de laicy, ou, depois que nasceram meus filhos de "vó laicy". mas hoje eu disse "adeus, mamãe, vá com deus. que a existência divina crie um caminho de luz e te leve direto para junto dos anjos e de nossa senhora. adeus, mamãe. obrigado por tudo que tu me deu. pelo amor de mãe que tu tinha por mim. a gente sempre pensa que as pessoas não vão morrer nunca e acaba não falando as coisas. quantas vezes fui na tua casa e ficava te ouvindo as histórias e não falava as coisas que achava que devia te falar. que coisas eram essas? que eu te amava, por exemplo. que às vezes eu queria um colo teu. eu gostava muito quando a gente sentava pra tomar vinho e conversar. não sei porque eu não ia mais vezes, mais seguidamente na tua casa. eu podia realmente sentir a tua solidão. eu sabia que era horrível ficar tão sozinha. eu me culpava por não ir mais seguido até a tua casa. e sentia saudade. e não ía. eu sabia que tu estava pedindo socorro quando quebrava o braço, depois o ombro e depois o braço de novo. e sabia que tu ficava feliz porque a gente tinha que se ver quase todos os dias pra fazer a fisioterapia naquele lugar horível. e eu ficava contente quando era carinhoso contigo e te massageava as costas. quando eu era criança eu te acariciava tanto e depois... onde foi que isso se perdeu? porque isso se perdeu? será que fiz tudo certo? sempre tive a certeza de que eu não era um bom filho. sempre me senti em dívida. a sensação que eu tinha (tenho) é que nunca fui suficientemente bom. e parece que tu morreu com a mesma impressão. a de que tu nunca foi suficientemente boa para mim. por que fizemos isso um com o outro? sempre me senti mentindo quando dizia que trabalhava muito ou que tinha pouco tempo. na real, fiquei muito assustado com tudo isso. com medo. confuso. mais confuso do que tenho andado nestes últimos quatro anos. da nossa entrada no carandiru até eu ti ver num saco de plástico no necrotério, um turbilhão de coisas se passaram em mim. muitas perguntas sem resposta. porque a vida é assim? a gente é só este corpo e acabou? que idiotice é essa de envelhecer e ir ficando cada vez mais debilitado e senil e gagá e decrépito? pra que tudo isso? qual o plano? minhas costas doem muito. parece que eu tenho uma faca cravada nas costas. adeus, mamãe. como foi ruim ti ver partir. coloquei a mão na tua barriga que um dia foi a minha casinha e me senti tão teu, tão ligado a ti. que grande amor sentimos um pelo outro. levei um choque quando entrei com minha mamãe no "carandiru". assim é chamada uma anorme ala do grupo hospitalar conceição que recebe dezenas de pessoas na emergência. fazem uma triagem e quando a coisa é séria eles internam o paciente e deixam ele esperando um leito estacionado no carandiru, que é uma sala onde cabem, digamos, 40 pessoas, e tem uns 150 lá dentro. tem cama, tem maca, tem cadeiras de roda, tem cadeira normal e um batalhão de enfermeiras, auxiliares e atendentes se esgueirando em estreitos corredores. Uma outra característica do carandiru é que ele tem de tudo. só não vi sangue. aliás, o lugar lembra aquelas enfermarias de filme de guerra, só que sem sangue. mas tem de tudo. fiquei imaginando as trocas de vírus, germes, bactérias e outros bichos que circulam por ali. minha mãe chegou com uma infecção no pulmão, e os outros 149? cada um tinha uma merda diferente. e tudo isso circula no carandiru do conceição. fiquei apavorado. tomei um choque de realidade e de miséria humana. adeus, mamãe. vai com deus. me protege.

PEQUENAS REFLEXÕES QUE ACOMPANHAM A PESSOA


Este na foto sou eu. Sou ator e diretor de teatro, embora não acredite que faça bem nenhuma das duas coisas. No máximo, engano. Tenho 53 anos e cheguei nesta idade com tremendas reflexões, pesando, incomodando, perturbando minha cabeça. São dúvidas terríveis à respeito do passado, do presente e do futuro. Sinto como se os 50 anos fossem um divisor de águas, a descida da serra da vida, lomba abaixo na velocidade vertiginosa dos tempos pósmodernos. Tento agarrar-me à vida e aproveitar o mais que posso, mas percebo que a vida me escapa por entre os minutos perdidos e então tento inutilmente recontar os minutos perdidos, o tempo perdido, detectar as escolhas erradas, contabilizar os fracassos do percurso para chegar a aniquiladora sensação de ter feito mais de 90% das suas escolhas erradas. A demolidora certeza de ter fracassado.
Considero-me um artista medíocre e medroso e que, em diversos momentos, deparei-me com a barreira concreta dos meus limites intransponíveis, fracassando na missão auto-imposta de construir uma obra perene, quando lido com uma arte absurdamente efêmera. Fico pensando, cá com meus modestos botões: uma pessoa que pensa assim, vai continuar pensando assim pelo resto da vida, e então, daqui há, digamos, 10 anos, estará pensando se não errou nas escolhas que fez durante estes 10 anos. Ou, pior, pensando nas escolhas que está fazendo agora, e errando, sem saber o que é certo e o que é errado. Levado por uma profissão que me encantou desde a primeira vez que representei, mas que, até o presente momento, devo responder diariamente porque é necessário continuar acreditando. E sempre a dúvida. E em todos os tempos, condenado. É possível. É bem possível. Mas são apenas reflexões de alguém que durante toda a sua vida foi levado impulsivamente a fazer suas escolhas. Com as mulheres, todas, acertou sempre em cheio. Com o teatro, com a profissão, ele não tem tanta certeza.

SEMPRE ATUALIZANDO


Trabalhando num bar na beira da Praia do Rosa e hoje aqui sentado muito tempo nesta cadeira na frente deste computador. Tentando entender tudo que está se passando na minha vida. Tentando sentir o que é mesmo que eu estou sentindo? A cada momento. Tendo lido bastante. Li O Inimigo do Povo, que me fez lembrar e refletir sobre minha relação servil com a Secretaria da Cultura do Estado e do Município. Da minha relação intimidada diante do poderoso Fumproarte, entidade que decide os destinos da cultura portoalgrense, ou pelo menos pensa e acredita que decide apenas porque tem a chave de um cofre furado que não tem mais como atender a demanda cultural exigida pela cidade e pela multiplicidade de grupos e pessoas que se aventuram pelo caminho da arte. Li Antígona. Assisti o Édipo do Luciano Alabarse. Tenho tido bastante tempo pra mim mesmo e para me dedicar a refletir um pouco sobre porque diabo, são os postes que estão mijando nos cachorros?