terça-feira, 30 de junho de 2009

RECORDAÇÕES DO DECAMERON - CAPÍTULO 1

Eu havia sido convidado pelo Ói Nóis para atuar na montagem do Fausto. Comecei a ensaiar mas não me adaptei ao jogo de vaidades que rolava entre o grupo naquele momento. Saí. Então o Luiz Henrique Palese e a Adriane Mottola, diretores da Cia. Stravaganza me convidaram para trabalhar como ator na encenação do Decameron. Eles estavam cheios de idéias. Os ensaios começariam pra já. E eu, que nunca me imaginei fazendo comédias, aceitei a proposta, e alguns dias mais tarde já estava ensaiando com a Adriane, a Angélica Borges e o Marcelo Fagundes. Improvisações sobre diversas cenas do livro que o Palese havia escolhido como possíveis candidatas a fazerem parte da peça. Aulas de bufão, exercícios físicos, aulas de pirofagia, preparação corporal e ensaios diários. O Palese enlouquecido com os cenários, figurinos, iluminação e tudo o mais a que ele se dedicava fazer, começou a faltar aos ensaios. Entrou o Serginho Etchichury como assistente de direção. O cenário que deveria ser uma linda praça medieval transformou-se numa gigantesca carroça de madeira que deveria ser manobrada em cena. As cenas, que improvisamos em português, seriam faladas em italiano arcaico. Começaram as aulas de italiano. Com o cenário definido foi desenhado no chão a planta baixa da carroça. O Serginho fazia a ponte com o Palese. A peça ia se construindo. Tive um acidente de moto e fiquei um mês de molho. Os atores iam pra minha casa pra bater texto. Quando chegou perto da estréia começaram as grandes preocupações com o término da carroça. Eu havia imaginado um carroção muito grande. Era mais. Era gigantesco. Com portas, escadas, alçapão, gavetas que se abriam, muitos truques. Fomos todos para a Epatur auxiliar no trabalho de construir a carroça. Na véspera da estréia chegamos mais ou menos as seis da manhã no Teatro Renascença. Completamente virados. Passamos a manhã montando a carroça. A tal manobra foi cancelada porque não havia condições de rodar com a carroça e muito menos de manobra-la como o Palese pretendia. Tudo ficou pronto muito perto da hora de abrir o teatro para a entrada do público. Nervosismo geral. Muitas mudanças de última hora. Começou a peça. Eram seis ou sete cenas. Lá pelo meio as portas trancaram. Não abriam. Não fechavam. Foi bem difícil. O Professor Luiz Paulo Vasconcellos, na época crítico da Zero Hora, desancou o espetáculo. O final de semana de estréia serviu para ajustar inúmeros detalhes do espetáculo. Ao final da primeira temporada do Renascença já podíamos sentir que a peça era muito boa. Era maravilhosa de se fazer. O público ria muito. As gags funcionavam. As portas funcionavam com perfeição revelando e escondendo cenas.

domingo, 21 de junho de 2009

A PRIMEIRA VEZ A GENTE NUNCA ESQUECE


No verão de 1988 fui pela primeira vez ao Rio de Janeiro. Fazia parte do elenco da peça O Ferreiro e a Morte e fomos apresentar o espetáculo no Rio. Tudo pago. Maravilha! Levei toda família. Aí na foto, em primeiro plano aparecem o Pablo e a Danielle. Se estou acertando o ano estavam, repectivamente, com 10 e 11 anos. Este cara magro, esbelto, com leves entradas começando a aparecer é o ator Elison Couto, colega de várias peças.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

CONFISSÃO

Está bem, eu confesso: Eu era o Remendão.
Na foto: Charles Albert, Vera Muccillo, Elton Manganelli, Cascatinha, César and I.
Intervalo de gravação do Guaíba Criança em setembro de 1982.

CADERNOS DE VIAGEM


terça-feira, 16 de junho de 2009

CHACRINHA E RITA CADILAC

Aqui eu realizei duas façanhas com uma única pedrada: fazendo um cover do velho guerreiro com a participação da própria Rita Cadillac, a mais encantadora, famosa e gostosa das Chacretes. Acompanhei palmo à palmo a carreira de Rita no auge da minha adolescência. Que loucura!!


domingo, 14 de junho de 2009

MEMÓRIAS MEDÍOCRES 8 - A GONORRÉIA

No meu bairro, o Jardim Botânico, tinha um puto. quer dizer, devia ter mais, mas apenas um era assumidamente gay. Somente sua mãe não sabia. Em casa roncava grosso, falava que nem homem. Morava ele e a mãe, uma senhora de idade avançada. No fundo, ela devia saber, mas compactuava com ele. Seu nome era Luís Fernando, mas a gente o chamava de Lulu. Ele sempre contava em noite de lua cheia transformava-se em mulher e saía pelo bairro, de casa em casa, pela noite inteira, dando pra todos os homens que queria enquanto suas esposas roncavam.
Pois, certa vez, alguém da minha turma convenceu o Lulu a dar pra nós. Fizemos uma vaquinha, raspamos nossos cofrinhos, e fomos para o parque Jardim Botânico esperar pelo Lulu. Éramos mais ou menos seis. O mais velho devia ter treze anos. Eu tinha 12 anos e era minha primeira vez. a primeira vez que participava de uma expedição deste gênero no meio do mato do Jardim Botânico. Atravessamos o mato, os maricás, as arueiras coceirentas. Chegamos na clareira combinada. Na hora marcada chegou o Lulu e atendeu com prazer a cada um de nós. Sei que não fui o último, mas não lembro qual foi a ordem. O primeiro foi o Pardal, apelido do Paulinho, filho adotivo da dona Filhinha e do seu Lotário. Foi o primeiro porque fora ele quem acertara tudo.

Dois dias depois chegou a febre, a ardência no pau. No terceiro dia começou a pingar um corrimento que lembrava pus. Não sabia o que fazer. Não podia contar pros meus pais. Seria o fim do mundo. Provavemente eu levaria uma surra do meu pai. No quinto dia eu não tinha mais como esconder. Não suportava mais a dor pra urinar e a situação cada vez piorava mais. no sexto dia contei pra minha mãe. Passado o primeiro momento de recriminações até que ela reebeu bem. O escândalo foi pequeno. O segundo momento foi religioso. Fui tentado pelo demônio e deus me castigou. Eu deveria me confessar no domingo. Teríamos que contar pro meu pai, pois somente ele saberia o que fazer. Mais uma dose de vergonha e medo. Eu contei tudo enquanto minha mãe fazia comentários para amenizar a situação. Tive que mostrar o pau pro meu pai. Momento difícil. Eram outros tempos. Estamos falando de 1966.

Levaram ao médico que receitou tetrex. Acho que é uma penicilina. Remédio pra febre e um negócio pra lavar o negócio. Foi passando. Aliviando geral.

Passada a crise, curada a gonorréia, meu pai me chamou pra saiar com ele. Me levou até a frente de um cabaré de terceira classe que tinha no centro da cidade, acho que perto da Praça da Alfândega. Me deu uma grana e disse que de agora em diante quando eu sentisse necessidade de fazer o que havia feito, eu devia fazer com mulheres e então devia procurar mulheres nesta casa. Deu sua moral de cueca e foi embora me deixando ali, parado, apavorado. Dei um tempo, fui no cinema e depois voltei pra casa.
Na foto, estamos eu e o Pablo, na Praia do Rosa. Mais ou menos, 1991. Estou ensinando-o a pilotar a moto. ele tinha mais ou menos a mesma idade que eu quando peguei a tal gonorréia.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

MEMÓRIAS MEDÍOCRES 7 - A MORTE


Hoje vou escrever sobre uma das minhas primeiras mortes. É assim que chamo cada uma das vezes em que não morri por muito pouco. Como dizem, só não morri porque não era minha hora. Por duas vezes quase morri afogado. Outra vez bati a cabeça num poste e caí embaixo de um bonde. Mas a mais perigosa e mais próxima da morte que eu me lembro foi quando quase me matei enforcado numa corrente pendurada na carroceria de um caminhão.
Eu morava na Rua Surupá - palavra indígena que significa "ave sem rabo". Não me perguntem porque virou nome de rua, nem se Surupá foi o nome de alguém, de algum chefe indígena. Mas, era exatamente isso que sempre li (e me perguntei) na placa colocada na esquina. Na frente da minha casa, do outro lado ra rua, morava um senhor, cuja profissão era dirigir um caminhão que fazia entrega de leite para armazéns, mercados, bares e restaurantes. Trabalhavam neste tipo de caminhão, três pessoas: o motorista e dois ajudantes, que eram os que faziam o trabalho braçal de carregar o caminhão, descarregar a mercadoria para os clientes e colocar no caminhão os engradados de metal que continham as garrafa de leite. Sim, o leite era vendido em belíssimas garrafas de vidro. Na parte traseira da carroceria destes caminhões, haviam, de cada lado, uma corrente, mais ou menos comprida, para auxiliar os ajudantes a subir e descer do caminhão. O sujeito agarrava com as mãos na parte inferior da corrente, que era fechada em si mesma, formando uma argola, uma espécie de forca.
Certo dia, no entardecer... acho que era verão, porque eu estava com pouca roupa. Devia ser mais ou menos 19h30, eu ja havia jantado e saído pra rua pra esperar que os amigos também jantassem aparecessem na rua como sempre acontecia. O caminhão estava estacionado na frente da casa do seu proprietário, que com certeza estava em casa jantando. O trabalho dele começaria somente lá pelas dez horas da noite. Tudo meio escuro. O caminhão ali sozinho. Atravessei a rua. Sentei na boléias do caminhão. Dei a volta até chegar na traseira. Subi na correceria e fiquei brincando de entregador de leite. Subi e desci várias vezes me pendurando com dificuldade numa das correntes. No meio da brincadeira tive a brilhante idéia de enfiar a corrente no pescoço. fiz várias palhaçadas com a corrente no pescoço. Olhei lá para baixo, para o calçamento de paralelepípedo, achei, com certeza, que o comprimento da corrente era suficiente para que meus pés tocassem no chão e pulei. Os pés não alcançaram no chão. Momentos de desespero total. Sufocamento. Não dava pra gritar, pra pedir socorro. Desespero. Esperneando.
Como não morri, não sei quanto tempo faltava para que eu morresse. Não sei estimar com certeza quantos segundos fiquei pendurado. Vinte? Quinze? Mais tempo? Num determinado momento, certamente enviado pelo meu anjo da guarda, saiu de casa um amigo. Guilherme. Nunca mais esqueci o nome dele. Nunca mais o vi depois que ele mudou-se da Surupá. Vinha comendo um pedaço de pão. Falou comigo. Perguntou o que eu estava fazendo. Viu que eu não coseguia falar e caiu-lhe a ficha que devia me ajudar imediatamente. Tentou me suspender com as mãos. Não conseguiu. Eu era maior do que ele é mais pesado. Então, o Guilherme atinou de enfiar os ombros embaixo dos meus pés e me erguer o quanto desce. Deu certo. Assim que ele me ergueu um pouco, eu mesmo arranquei a corrente do meu pescoço e corri pra casa sem poder gritar pela minha mãe, sem poder chorar. As lágrimas rolavam sem parar, mas não tinha som. No meu pescoço ficaram durante algumas semanas - ou será que foram dias? - as marcas dos grilhões da corrente.
No dia seguinte eu e o Guilherme tivemos uma séria discussão que acabou em briga. A gente se pegou no pau e como eu era maior, eu bati nele. Quebrei a cara do meu salvador no dia seguinte. Meu pai ficou sabendo e me deu uma surra pra eu aprender que não devia bater em alguém que salvara miha vida. Minha mãe levou um presente pro Guilherme e agradeceu e ele e a toda família dele pelo salvamento.