quarta-feira, 28 de julho de 2021

MEMÓRIA 01 - REMENDÃO



Como o Remendão foi o mais lembrado nos comentários que recebi, é sobre ele que vou escrever a primeira desta série de oitenta memórias associada a fotos que vou postar aqui como contrapartida ao meu Projeto Trajetória. É um excelente começo, já que eu tenho um enorme apreço e carinho por este personagem.
O ano era 1981. Eu estava na maior pindaíba. Completamente duro, sem dinheiro pra nada. Era casado, tinha dois filhos e vivia um dia de cada vez resolvendo diariamente a sustentabilidade da família.
Na mesma época eu estava ensaiando uma peça infantil que eu acreditava que seria a salvação da lavoura quando estivesse pronta. A peça era “O que seria do Vermelho se não fosse o Azul”. Eu escrevi a peça, era o diretor, o produtor e atuava. Isso renderia 4 “bolinhas” na futura divisão dos cachês.
Uma tarde voltei do ensaio e tinha um recado pra mim. Não lembro de que maneira o recado chegou. Não existia celular e eu não tinha telefone em casa. O recado dizia que eu devia ligar para Liliana Reid, da direção da TV Guaíba, pois ela tinha uma proposta de emprego pra mim num novo programa infantil que seria lançado pela emissora. O salário era, digamos, atualizando, quinze mil reais.
Fiquei louco. Fui até o orelhão mais próximo e liguei muitas vezes. Era sexta-feira, feriadão e a Liliana não estava. Só na segunda-feira. Sofri o final de semana inteiro de ansiedade querendo que a segunda chegasse logo.
Na segunda-feira de manhã liguei de novo. A Liliana não estava. Só de tarde.
Liguei. Ela havia saído. Quase tive um enfarte. Só consegui falar com ela na quarta-feira. Pensei que havia perdido o emprego.
Só que não era uma proposta de emprego. Era um convite para fazer um teste para o programa Guaíba Criança que entraria logo no ar. Quem me indicou foi a grande atriz e diretora Suzana Saldanha. Eu havia trabalhado com a Suzana. Ela era apresentadora do Guaíba Ao Vivo e quando soube do teste disse pra Liliana me chamar. Santa Suzana. Mal ela sabe que ajeitou minha vida.
Fiz o teste morrendo de nervoso. Medo de não ser aprovado. Achei que meu teste não tinha sido bom. Estava indo embora cabisbaixo quando uma produtora do canal chamada Vera Vergo me pediu um favor:
Roberto, você pode ajudar as atrizes que serão testadas para a função de apresentadoras contracenando com elas?
Passei a tarde me divertindo. Cada vez me soltando mais. Colaborei numa dúzia de testes com diversas meninas. No final da tarde eu saí da Guaíba aprovado. Devia voltar na sexta-feira pra assinar o contrato. Meu único emprego de carteira assinada na vida. O salário não era tudo aquilo. Devia ser equivalente a uns cinco mil mensais. O que era muito dinheiro. Pra mim, então, era muito mais do que eu jamais imaginaria ganhar.
Dois meses depois estreou o Guaíba Criança. Com música de Léo Ferlauto. Cenário e arte do Elton Manganelli. E com a Flavinha Aguiar como apresentadora. Estes dois últimos eu já conhecia. Havíamos atuado juntos em “A Comunidade do Arco-íris, de Caio Fernando Abreu, com direção da Suzana Saldanha.
O Elton Manganelli criou o boneco Remendão. A Vera Mucillo entrou como apresentadora. A Vera Vergo era a produtora do programa. Maria Helena Calixto. E juntos nós criamos o formato do programa com seus jogos, gags e brincadeiras. “Cabeças” que chamavam os desenhos da programação infantil. Uma época de intensa criatividade e sintonia da equipe. Brincadeiras como o Quindim do Remendão e o Jogo da Velha ficaram famosas no programa. As crianças participavam no estúdio interagindo com o Remendão.
Alguns meses depois, por indicação da Aninha Comas (que era do Guaíba Feminina) o Remendão começou a trabalhar em festas infantis. E aí, meus amigos, eu ganhei muita grana. É verdade que passei mais tempo dentro da roupa do Remendão do que fora dela. Quase tive uma crise de identidade de tanto tempo que eu era o Remendão.
O sucesso foi tão grande que escrevi uma peça de teatro chamada “Remendão & Cia”. A peça estreou no extinto Cine Teatro Presidente que hoje é uma igreja evangélica. Foi o maior sucesso. A fila se estendia por duas quadras da Benjamim Constant e dobrava na rua Olinda seguindo por mais um quilômetro. Uma temporada de um mês com o Teatro Presidente lotado aos sábados e domingos de tarde.
Na peça o Luís Emílio Strassburger interpretava o Elton Manganelli. A música foi composta e interpretado ao vivo pelo próprio Léo Ferlauto. No elenco tinha a Márcia Erig, a Flávia Aguiar e a Vera Mucillo.
O Guaíba Criança durou alguns anos e acabou. Levamos o programa para a TV Pampa com o nome de Remendão & Cia. Durou mais dois anos e a emissora encerrou o contrato por falta de anunciantes. O Remendão ficou sem casa. Ficou somente na memória das crianças que frequentavam o estúdio e/ou assistiam pela televisão. Aquelas crianças estão hoje na faixa dos 45 anos e só elas é que lembram do boneco Remendão.
Na minha vida foi um tempo excepcional. Talvez o momento no qual eu mais me senti um ator profissional. Embora quase ninguém me conhecesse, eu era bem remunerado, prestigiado e querido pelas crianças. Entre outras coisas comprei um telefone e passei a dizer sim para os meus filhos no supermercado. Um período realmente memorável na minha vida. Ao qual sou imensamente agradecido por ter vivido.
No Google pode-se encontrar alguma coisa sobre o programa em:

Visualizar o vídeo TV Foca - Remendão do YouTube 

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